sábado, 30 de dezembro de 2017

CHIQUINHA

CHIQUINHA

É inverno, Minha casa no verão,

Tornou-se silenciosa e triste,

Tornou-se de repente um velho trem,

E no barulho ensurdecedor do meu presente,

A Chiquinha mansamente apareceu.

Ela trouxe com sua presença o paraíso,

Um terno riso cravejado de estrelas,

O seu riso é um ardente sol,

Que me cheira a flor de pessegueiro,

Isolado em um mar de argenta luz.

Eu vi em sua blusa o azul do céu,

Aquele céu de primavera,

Insinuando um bando de andorinhas,

Em revoada na busca do verão.

A sua saia então, o que parece-me?

Eu vejo na sua saia o meu outono,

Com seu cinza nevado de incertezas,

E suas sandálias me lembram um pescador.

Os cabelos de Chiquinha, o que me lembram?

Lembram-me longas notes de insônia,

Onde o vento clama longe,

Canções quase perdidas em um tempo.

Os seus olhos são faróis na tempestade,

Lançando sua luz castanhos escuro,

Por sobre o lençol verde desta selva,

Que me lembra com saudade o arco-íris,

Azul, vermelho e branco do teu céu.

Hoje a Chiquinha apareceu,

Trazendo em sua boca o batom,

Vermelho como o corpo da maçã

*J.L.BORGES
1988

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