terça-feira, 16 de outubro de 2018

NÃO SE PODE ENCOMENDAR

NÃO SE PODE ENCOMENDAR

Não se pode encomendar,
O céu de um azul  distante,
Com o sol arisco brilhando,
Os pássaros livres a cantar,
Nuvens alvas a flutuar,
E o vento soprando brando.

Não se pode encomendar,
Uma chuva fria macia,
Com nuvens pesadas ao léu,
Com raios riscando o céu,
O vento soprando forte,
Tornando noite o meu dia.

Não se pode encomendar,
Gaivotas pairando ao largo,
Barco ao longe velejando;
O mar com ondas serenas,
Areia fina, tão quente,
A queimar os nossos pés.

Não se pode encomendar,
Uma noite pura, estrelada,
Eu só, numa longa estrada,
A cantar uma canção;
A lua brilhando ao alto,
E uma coruja piando.

Não se pode encomendar,
Tarde outonal em um campo,
Eu na sombra de uma arvore,
Vendo os bois que estão pastando;
Sorrindo, falando alto,
Pensando que estou voando.

Não se pode encomendar,
Uma manhã de primavera,
Chaveiros, dados e esferas,
No quintal de minha casa,
No jardim flores radiantes,
E um rouxinol a cantar.

Não se pode encomendar,
A outra face da lua,
Você no meio da rua,
Correndo vir me abraçar;
O sol beijando minha face,
A saudade a acariciar.

Não se pode encomendar,
A infância, nunca mais;
Ela partiu, foi embora,
Fugiu com o dia de ontem,
Me deixando aqui sozinho,
Sem saber o que fazer.

E aqui estou novamente,
Sozinho, sem ter ninguém;
Ouvindo um disco a tocar,
E pensando porque partistes,
Não soube te encomendar,
Ou você me encomendou?
                                    
*J.L.BORGES
Porto alegre 1978

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