O SONHADO FILÉ DE SALMÃO
Miro sempre foi uma pessoa que pensava a frente, com 10 anos começou a trabalhar, era engraxate, seu primeiros centavos que recebeu numa engraxada de sapato reservou a metade para futuras dificuldades que poderiam surgir, pensava ele, o tão sonhado picolé cremoso fica para depois, tenho bastante tempo, e assim foi vivendo, ser ir a um cinema,sem ir a um parque de diversões, sem ir a baile algum, sem aproveitar nada, pois tinha medo de um amanhã de dificuldades.
Aos 20 anos já trabalhava a algum tempo em uma firma com carteira assinada e tudo, certo dia ao receber seu salário, teve vontade sei lá o por quê de comer um filé de salmão frito, chegou a se dirigir a peixaria, na porta estancou, e desistiu de satisfazer este desejo gastronômico, imagina fazer esta extravagância; e quando estivesse com 40 anos, daqui a 20 anos, pensa ele, poderá fazer falta, e lá se vai ele comer seu arroz com feijão e ovo, as vezes frango.
Sua vidinha mediocre foi seguindo seu curso, da casa para o trabalho, do trabalho para casa, fazendo serão, e poupando...poupando…, tempos depois acaba casando, nem pensar em festas capaz, no futuro pode fazer falta, e a lua de mel foi trabalhar mais e mais, com muito serão, pois tinha bocas para alimentar.
O tempo foi passando e, aos 40 anos sentiu novamente o desejo de provar o tal filé de salmão frito, recebe seu salário e vai naquela peixaria que ainda estava lá, firme que nem coqueiro, lá chegando nem ultrapassa a porta de entrada, trava e desiste daquele compra gastronômica que poderia comprometer seu orçamento.
É um ato exagerado,fala a seus botões, vai que daqui a 20 anos quando estiver com 60 faça falta; e lá se vai ele comer seu arroz com feijão e ovo, as vezes um frango ou um pernil de porco em promoção.
Passou-se mais 20 anos, ele com 60, prestes a aposentar-se, sente certo dia aquela louca vontade de comer o tal filé de salmão frito, pergunta o preço, vejam bem, já foi um bom avanço, o sujeito chegou a perguntar o preço, e quase cai de Costa.
Quê absurdo, espragueja ele ao já velho peixeiro, não compro nem que a vaca tussa, e imaginou-se 20 anos a frente, ele com 80 e aquela compra fora de seus projetos, feita à 20 anos atrás ruindo o seu orçamento.
Vou fazer uma promessa, diz ele ao velho peixeiro, quando tiver 80 anos vou comer esta iguarias, juro por tudo que é mais sagrado, e lá se vai ele comer seu arroz com feijão e ovo, as vezes frango ou outra carne em promoção.
E o tempo foi passando...passando, sem o homem jamais ter a um cinema, a um baile qualquer, a o futebol,a um circo, um parque de diversões e nem mesmo a um bordel qualquer, enfim a divertimento algum, pensando sempre 20 anos na frente, e quardando quase todo o seu salário numa poupança com juros ridículos,poupança esta que ele não mexia nunca.
De repente ele esta com 79 anos, a um ano de cumprir sua promessa feita a 20 anos atrás de comer o tão desejado filé de salmão frito e eis que numa noite fria de inverno uma dor aguda no peito e o infeliz cai duro, sem provar uma tira do tal filé de salmão.
Dias depois vem a partilha de seus bens, e os herdeiros exultantes a usufruirem sua poupança de 69 anos, poupados centavos a centavos, alguns de seus herdeiros comendo file de salmão frito com vinho chileno, outros bacalhau com vinho do Porto, é assim a vida.
*J.L.BORGES
2020/09
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